quarta-feira, 21 de setembro de 2011


 
We enter the world alone and we leave it alone.
(Meredith Grey/ James A. Froude)





Encantou-se com um mar sereno, nem o atirar de uma pedra o perturbava... O horizonte fascinava-o, a vida marinha prendia-o. Caminhou de olhos presos ao chão pelas ruas pavimentadas de alcatrão mas também por caminhos de terra. Caiu por terra a tentação de subidas a montes. Iniciou escaladas de montanhas, deram-se preenchimentos interiores pelas vistas da planície e descansos nas margens de rios... Um descanso apetecível, por vezes merecido, outras vezes uma miragem fruto de um terrível cansaço. Ó, que antagonismo este. Enfim, levantou-se e lá seguiu, sabe-se lá para onde, sabe-se lá para quem, sabe-se lá como. Mas levanta-se sempre. Melhor, abre os olhos em direcção ao céu e lembra-se de como o horizonte pode ser fascinante... Talvez seja a resposta ao como e ao onde. E ao quem? Seguiu. Surgem sempre encruzilhadas pelo caminho, que turbilhar de pensamentos ocorrem num momento decisivo! Uma vez olhou para ver que opções tinha ao seu dispôr: avançar rumo a uma cidade turbulenta, moribunda, cheia de vida, enfim, uma cidade fácil devido ao seu passado mas imprevísivel quanto ao seu futuro, ou então escalar mais um montanha que levaria o seu corpo e mente a desgatarem-se mais ainda, com medo de um descanso posterior. Não tem ninguém do seu lado, aparentemente. Fechou os olhos. Apertou os punhos, cerrou os lábios. Deu um passo rumo à montanha. A montanha pode intimidar, mas a sua confiança fá-lo torná-la possível de ultrapassar e guardar no seu coração ares que, mal o cume é alcançado, fazem com que os seus olhos brilhem tanto como as luzes da cidade, que o seu corpo ganhe a vida de uma cidade. Chegou-se ao cume... Infelizmente, chegou-se ao cume... A montanha não o deixou permanecer muito tempo no cume, mas o que transporta no seu coração vigorará para a eternidade. Desceu a montanha e seguiu. Não está cansado, mas a montanha afasta-se. O olhar atrevia-se a revê-la, mas a montanha voltou a ser imponente, sem razão alguma. Seguiu, não fugiu, não se afastou. A montanha aparentemente não ficou com nada dele, mas ele ficou com a montanha no seu coração, ficará com a montanha no coração até ao fim da sua vida. Há sempre alguma coisa que nos faz respirar, que nos faz seguir, mas que também nos faz querer voltar. O coração deste caminhante é um armazém de sensações, os olhos são autênticas máquinas fotográficas, a mente torna-se uma sala de cinema quando o sono chega. E ele continua a viver assim, sem medo que uma cidade ilusória o agarre ou que uma montanha o derrote interiormente. Palmilhará sete palmos de terra. Será levado interiormente por aragens mas guiado por ventos que sabe que não o trairão.

P.s.: este texto é uma espécie de auto-biografia e ao reler, acho que todos devíamos pensar nisto: a felicidade e a pessoa, que hoje já não nos conhece, não começaram a ser construídas na altura em que nos conhecíamos? Não adianta arrepiar caminhos, quem sabe se depois do dobrar de outra montanha, o vento (que em tempos nos guiou) reaparece.